sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Entrevista com Fabrício Monteiro, autor do livro “O niilismo social: anarquistas e terroristas no século XIX”


 
[O historiador Fabrício Monteiro* acaba de lançar o livro “O niilismo social: anarquistas e terroristas no século XIX**” (Editora Annablume). Leia a seguir a entrevista que ele concedeu a Moésio Rebouças da ANA*** sobre a sua obra.]

Agência de Notícias Anarquistas > Gostamos de começar a entrevista pedindo para a pessoa falar um pouco de si, de sua trajetória libertária...

Fabrício Monteiro < Sou natural de Araguari (MG), mas vivo na cidade de Uberlândia faz tempo. O anarquismo surgiu para mim via educação. Inicialmente, a partir de minha própria experiência como estudante na época do colegial, foi tornando-se cada vez mais evidente e nauseante para mim a hipocrisia do sistema escolar oficial. As manifestações que, para nós alunos, pareciam criativas e reflexivas no interior da escola eram classificadas com “inapropriadas” (e suprimidas como tal). O sentimento, já claro naquela época, da ridícula contradição dos lindos discursos de professores e da direção escolar sobre nós como “cidadãos” sendo formados e do que eles mesmos pregavam mais tarde sobre o santo “mercado de trabalho”. Depois de ter uns parcos contatos iniciais com as idéias anarquistas fui estudar História na faculdade (ano 2000), com a única intenção de ser professor e fazer diferente do que eu mesmo tinha passado. Na Universidade Federal de Uberlândia, durante a graduação, havia um grupo de estudantes que haviam participado de um “cursinho pré-vestibular alternativo” (muito em voga na época), mas que se retiraram do projeto após tentarem propor formas diferentes de trabalho com os alunos, para além do preparo para o vestibular. Formaram em 2002 o Projeto Educacional Circus (eu estava nesse meio), um curso-livre e auto-sustentado (a estrutura física eram algumas salas emprestadas pela universidade) que incluíam, na época, aulas e trabalhos com artes cênicas, humanidades, discussões político-sociais. Apesar de “disfarçado” oficialmente de “pré-vestibular alternativo”, o que mais chamava a atenção naquela experiência de educação libertária era a gestão coletiva do projeto, envolvendo professores e alunos em reuniões coletivas para a decisão – via consenso, quando possível – de todos os aspectos do grupo (desde gastos financeiros, destino de vagas remanescentes, pertinência ou não de assuntos de aulas...). O Projeto Circus terminou em 2005 (uma ala “pré-vestibuleira” venceu por força numérica) e, após um episódio malfadado (mas muito interessante, talvez eu o conte um dia...) de tentativa de construção de um “squat” na cidade por algumas daquelas pessoas somadas a outros grupos e indivíduos libertários, aquele núcleo original foi se dispersando...

ANA > E como surgiu a idéia de escrever o livro “O niilismo social: anarquistas e terroristas no século XIX”?

Fabrício < Diretamente o livro vem de uma pesquisa de mestrado. Minha preocupação principal é com a condição niilista atual, que, em poucas palavras, é motivada pela fragmentação de referências e valores e pelo intenso controle social sobre os indivíduos, o que atrapalha o desenvolvimento da autonomia de cada um. O século XIX e o terrorismo revolucionário surgiram como forma de comparação histórica com nossa contemporaneidade e como busca das origens políticas de alguns sentidos da palavra “niilismo”.

ANA > Ele acaba de sair do forno, não?

Fabrício < O livro saiu agora pela Annablume (maio de 2010). A discussão sobre o niilismo contemporâneo ficou de fora por enquanto.

ANA > E deu trabalho escrever este livro, pesquisar, levantar as informações?

Fabrício < Você vai perceber que não é um livro extenso (só 104 páginas no total), mas as discussões contidas ali são densas e não foram simples de organizar. Você começa com alguns questionamentos, vai atrás de documentação, percebe que novas perguntas que surgem não são respondidas por ela e tem que buscar novas informações em outros lugares... No total foram uns três anos e meio de pesquisa mais um pouco para dar o formato final da escrita.

ANA > Poderia fazer um resuminho do livro? É uma obra baseada em muitas experiências “niilistas anarquistas”?

Fabrício < O termo “niilismo”, nos sentidos atuais (pois a palavra em si é mais antiga, mas tinha outras conotações, diferentes das de hoje) surgiu como uma tentativa de definição para grupos revolucionários russos da segunda metade do século XIX em luta contra o czarismo. Era uma palavra de caráter negativo, sinônimo de “destruição total da organização e valores sociais” usada nos jornais e literatura da época para denegrir os objetivos de transformação social dos revolucionários (Nietzsche, mais tarde se apropriaria da palavra e daria sentidos filosóficos diversos para ela). Percebe-se que, naquele sentido, o niilismo se assemelha a definição “burguesa” do anarquismo e essa ligação não era por acaso; assim como na Rússia o fechamento de cerco dos governos contra as ações revolucionárias – como o Ir ao Povo russo ou a Comuna de Paris na França – levou algumas pessoas às propostas de ação direta e violenta contra os governantes e burguesia através do terrorismo. O “niilismo” russo foi uma compreensão “importada” da Rússia (e somada a compreensões que as classes dominantes ocidentais já tinham sobre os anarquistas) para França, Itália, Espanha etc. O livro trata disso: discussão sobre esses movimentos russos no primeiro capítulo e o terrorismo anarquista na Europa ocidental no segundo.

ANA > Que personagens são descritos no seu livro?

Fabrício < Não há um aprofundamento específico em tal ou qual personagem, pois o objetivo é uma visão um pouco mais ampla sobre os acontecimentos políticos revolucionários e sobre as versões sobre eles (dos segmentos dominantes, através da literatura e dos jornais da época, e dos próprios revolucionários, através de seus depoimentos, discursos e memórias). As discussões envolvem o grupo Vontade do Povo e Netchaiev, na Rússia, Ravachol, Vaillant, E. Henry, Caserio, Lucheni, Czolgosz no ocidente. Discussões sobre a curiosa “Internacional Negra” e o infame Cesare Lombroso. E outras coisas.

ANA > Existe alguma figura do livro que você se identifique?

Fabrício < Individualmente não, mas me chama a atenção a sensibilidade de todos os anarquistas terroristas. Parece paradoxal, não? Mas a sensibilidade era algo que movia todos os atos daquelas pessoas. O fragmento de autobiografia de Lucheni (“História de um menino abandonado no fim do século XIX contada por ele mesmo”) é, nesse sentido, marcante.

ANA > Concordo plenamente quando você fala em sensibilidade destes "anarquistas terroristas". Você não acha que muitas destas ações levadas a cabo estavam impregnadas daquela máxima proferida por Bakunin, de que a vontade de destruir é ao mesmo tempo uma vontade criadora?

Fabrício < Exatamente. É claro que não se tratava dos atentados pelos atentados; das explosões pelas explosões. Quando Turgueniev cria seus personagens “niilistas” como puros destruidores ele, que faz uma literatura contrária à política revolucionária na Rússia, ajudou – e muito – na disseminação da idéia de que tratavam-se de “fanáticos” e “arautos do apocalipse”. Esta visão estendia-se também aos anarquistas por parte das elites e classes médias. Para estes grupos a proposta de criação de uma sociedade sem governantes e propriedade privada não se sustentaria, era o mesmo que propor a destruição pura e simples da sociedade porque seus “alicerces” não estariam mais lá. Por seu lado, depois de presos e condenados, os anarquistas não tentavam escapar da pena de morte ou se arrependiam de seus atos, pois tinham certeza que contribuíram para a construção dessa nova sociedade, sem exploração de classe e repressão governamental.

ANA > As ações expropriadoras da época também são abordadas na sua obra?

Fabrício < O foco central das discussões gira em torno dos diferentes sentidos para o “niilismo”, termo politicamente pejorativo atribuído aos revolucionários (inicialmente na Rússia). Um primeiro significado para essa palavra, na voz dos segmentos governamentais e “burgueses”, envolvia um grande espanto frente ao “desrespeito” que aqueles revolucionários mostravam a valores considerados intocáveis e inquestionáveis pelas elites (a religião, a propriedade, a autoridade governamental etc.): ser niilista era sinônimo, para estes grupos, de ser amoral. O máximo do “vazio de valores” (daí o “niil”, ou “nada” em latim) seria o atentado direto à vida de pessoas (juízes, reis, presidentes, policiais, donos de fábricas e empresas...). O livro, especialmente no segmento sobre os anarquistas, enfatiza estes episódios, discutindo, inclusive o caráter desta suposta “amoralidade” niilista. Paralelamente vão sendo mostradas as reações dos governos frente a este tipo de ação.

ANA > E qual era a participação das mulheres nestes episódios?

Fabrício < Especialmente no movimento revolucionário russo da segunda metade do século XIX as mulheres estavam ativamente presentes e em uma proporção nada desprezível. Uma das estatísticas citadas pode dar uma noção disso: durante a repressão do Estado czarista de 1874 à Campanha “Ir ao Povo”, 770 pessoas foram oficialmente presas, sendo que destas, 158 eram mulheres. A ação do grupo “Vontade do Povo”, que interceptou a comitiva de Alexandre II e assassinou-o com uma bomba em 1881, foi dirigida por uma mulher, Sofia Perovskaia. Ela seria presa e executada posteriormente (Gessia Helfmann acusada de participação nos planos também foi presa e morreria na prisão). Vera Zassulich, posteriormente uma das fundadoras do marxista Partido Social-Democrata russo, foi egressa da “Repartição Negra”, uma das organizações que tentou seguir a luta da “Vontade do Povo” após seu desmantelamento. Não conheço uma anarquista que tenha se engajado tão diretamente em uma ação do gênero, mas podemos nos lembrar de Mariette Soubère como uma das pessoas que ajudou a planejar e apoiou os atentados à bomba de Ravachol contra as residências de Bulot e Benoit.

ANA > De memória eu lembro da história de uma anarquista russa chamada Fanya Kaplan, que tentou matar Lenin...

Fabrício < E ele teve sua “vingança”, não é? Em uma proporção bem maior... lembremos da Ucrânia, por exemplo.

ANA > Houve algum país que se destacou pelo volume de ações “terroristas”?

Fabrício < Acho que não será surpresa ao destacar-se a Espanha entre os países onde a via terrorista teve um grande destaque, com algo próximo de 50 vítimas fatais (entre estas o primeiro ministro Cánovas del Castillo, em 1897) e mais ou menos 100 feridos. Itália e França também têm destaque, mas a preocupação dos governos era geral nesta época. Lembremos que a Conferência de Roma, realizada em 1898, quando os dirigentes europeus reuniram-se no auge dos atentados para tentar coordenar uma ação conjunta contra os anarquistas, nada menos que vinte e uma nações estavam presentes através de seus delegados.

ANA > Normalmente estas ações eram feitas em grupos ou individualmente?

Fabrício < A ignorância das diferenças do caso da Rússia com os países ocidentais, como França ou Itália, por exemplo, ajudou inclusive na fusão de sentidos do “niilismo” russo e do terrorismo anarquista pelos segmentos dominantes. A “sociedade secreta”, pequenos grupos clandestinos que se reuniam para planejar e executar atos revolucionários (não só terroristas), era comum na Rússia. O elevado grau de censura e repressão czarista forçou os movimentos revolucionários a organizarem-se dessa forma para tentarem continuar a existir. No caso dos anarquistas da Europa ocidental as ações eram muito mais individuais, desde a intenção em si, a escolha do alvo, o planejamento e a execução do ato. A seqüência de atentados na França, por exemplo, a partir de Ravachol, passando por Vaillant, Henry e Caserio não ocorreu como uma ação coordenada entre os anarquistas, que na maioria das vezes nem se conheciam, mas por uma sensibilização pessoal devido a prisão e execução do companheiro de luta anterior. A ação de Ravachol, destas citadas, foi a única planejada em grupo, mas era uma vingança imediata contra um juiz e também foi executada individualmente. Pensar que haviam “células” anarquistas terroristas espalhadas por toda Europa foi um pensamento comum entre os governos da época e que foi tão forte que gerou o “mito” da Internacional Negra terrorista, discutido no livro.

ANA > Na época estes “anarquistas terroristas” eram considerados muito danosos para o movimento libertário, recebiam muitas críticas por suas ações, não?

Fabrício < Sim. Mesmo que muitos anarquistas fossem favoráveis ao protesto aberto e a outras formas de ação direta, a ação terrorista era rejeitada como legítima ou útil por grande parte deles. Kropotkin, Faure e Malatesta são exemplos. Importante destacar, porém, que isso não transforma os terroristas em “individualistas” no sentido teórico do “anarquismo-individualista” de, por exemplo, Tucker. As referências de revolução, funcionamento da sociedade, ideal de organização futura da anarquia destes terroristas ainda eram coletivistas ou comunistas. Sua ação poderia ser isolada, pois eram sempre re-ações imediatas a atos do governo (execução ou prisão de um companheiro, repressão violenta de determinada greve, lei anti-anarquista aprovada etc.); o terrorismo anarquista não tinha como objetivo ser um mecanismo da revolução em si.

ANA > Ao escrever o livro, você encontrou algum episódio que merecesse um filme?

Fabrício < (risos) Pergunta interessante! Desde que não fosse feito em Hollywood! A vida de qualquer um deles daria um ótimo filme. Há sempre algo de fascinante em pessoas como aquelas. Na própria época, detalhes das prisões, dos julgamentos eram avidamente acompanhadas pela própria burguesia através dos jornais diários; as execuções eram vistas por centenas e centenas de pessoas nas praças. A trajetória de vida, desde a infância, de Ravachol e Lucheni, por exemplo, são muito marcantes em termos de demonstrar o sofrimento das classes operárias da época. As ações do Vontade do Povo (tentativa de explosão do comboio imperial, infiltração no Palácio de Inverno do czar e colocação de dinamite sob o assoalho...) são realmente espetaculares. Mas só seriam filmes interessantes se conseguissem captar a humanidade, por contraditória que fosse, daquelas pessoas e não as colocassem como “máquinas revolucionárias de matar”.

ANA > O seu livro trata mais dos movimentos russos e da Europa ocidental. Isto foi proposital ou você pretende escrever outro livro sobre o assunto, mas focando a América Latina?

Fabrício < Não foram locais escolhidos por puro capricho. Minha intenção primeira foi buscar as discussões mais iniciais sobre o niilismo em sua forma social-política e fui “obrigado” a tratar dos russos por isso. Os anarquistas da Europa ocidental surgiram como opção de dar uma seqüência direta disso, pois as acusações feitas contra os russos eram muito parecidas com aquelas feitas contra os anarquistas e também houve um “intercâmbio” entre as formas de ações dos revolucionários daqueles dois cenários. Sinceramente não tenho o plano de tratar do assunto na América Latina, convido outro a aproveitar essa sugestão. No momento o que me preocupa, como pessoa política e como pesquisador –coisas que não se separam - , é certa “versão” do niilismo na atualidade. Certo esgotamento na capacidade criativa geral da sociedade, a apatia resignada de muitos frente às situações que se encontram, a individualidade autônoma soterrada por medos que levam à busca pelo consumo de respostas fáceis e conformistas... Esta é a niilificação que me faz refletir hoje; a “nulidade” criativa e transformadora que persiste por aí.

ANA > Que relação você faz destas ações diretas “violentas” do século XIX com o insurrecionalismo anarquista de hoje, as ações diretas pela libertação animal e da terra?

Fabrício < Claro que são situações particularmente diferentes. O terrorismo revolucionário do século XIX só teve um impacto tão grande na memória social (até hoje a dinamite é relacionada com o movimento anarquista vez ou outra por críticos mais cabeça-dura) porque chocou valores considerados essenciais do ser humano por parte daquela sociedade. É o caso do valor da vida individual (pode parecer algo universal para nós, mas o valor da individualidade é historicamente e socialmente construído) e que não era considerada com o mesmo sentido pelos terroristas; talvez para eles a vida fosse ainda mais sublime que para a “burguesia” individualista.

Hoje a quase totalidade dos anarquistas não compartilha (espero!) o mesmo imaginário daqueles companheiros do século XIX, então sua ação direta possui outro caráter, penso eu, mesmo que também se utilize da “violência”. O “chamar a atenção” da sociedade para determinados problemas de forma “impactante” é necessário em uma realidade onde a apatia mantém-se ainda dominante, mas isso não tem mais o sentido de retaliação imediata, quase como uma “vingança” movida pelas emoções, como tinha no passado.
Destaco, porém uma semelhança: o ato “violento” demanda muita energia e riscos; ninguém o utiliza como primeira opção de ação. Não foi a primeira opção no século XIX e nem é hoje. No passado a censura total, a falta de brechas de atuação, as deportações, prisões imediatas e execuções sumárias levaram ao terrorismo. Atualmente o Estado e o poder do capital continuam controladores e fechando cada vez mais o cerco (através de novas armas e estratégias), com seu ridículo disfarce de democracia e liberdade de expressão, ou o insurrecionalismo não precisaria retornar com a força crescente de hoje.

ANA > O que eu percebo hoje na diversidade anarquista é que não há ações que tenham como alvo reis ou presidentes como no passado, até porque o nível de proteção e segurança destes figurões se sofisticou e mudou bastante. Mas também é fato que nos últimos anos aumentou, em vários pontos do mundo, as ações diretas incendiárias e de libertação animal, ataques a propriedades capitalistas, em defesa da natureza, expropriações, enfim, ações mais ousadas...

Fabrício < É verdade, embora às vezes todo esse aparato pode ainda falhar: não foi um atentado político, mas lembra do Silvio Berlusconi em dezembro passado? Mas estas ações mais ousadas, penso eu, ampliam-se hoje um pouco pelo que falei anteriormente. Percebemos que, por mais “liberdade de expressão” que tenhamos hoje (diferente do século XIX) ela não permite um debate de idéias verdadeiro na sociedade, a organização de formas de auto-educação populares efetivas etc. A maleabilidade e eficiência do capital e do Estado atuais em envolver, transformar e neutralizar iniciativas desse tipo, aparentemente mais “pacíficas”, é tão forte que alguns resolvem partir para ações mais diretas.

ANA > Você falou em "sensibilidade" anteriormente. A meu ver sensibilidade está intimamente ligada a coragem, ousadia... Aí eu pergunto: a anarquia cabe em corações medrosos?

Fabrício < A sensibilidade, na minha visão, envolve coragem, ousadia e também – talvez, sobretudo – a capacidade de perceber a posição do próximo. Sensibilidade envolve solidarizar-se, pois você consegue enxergar o outro como um ser humano igual a você. Se você sente dor, medo, humilhação etc. e tem sensibilidade para perceber que o outro também sente estas coisas aí está, a meu ver, meio caminho andado para o anarquista (mas a outra metade do caminho, da ação em si para o auxílio do outro também é fundamental). Não estou dizendo nada de caráter cristão – a não ser que alguém veja um cristianismo sem igrejas e também sem o auto-rebaixamento do indivíduo frente ao “sagrado”. Fazer atuar esta sensibilidade na sociedade requer fundamentalmente coragem e aí sim concordo plenamente com você, desde que respeitemos também o processo de cada um do fazer-se anarquista, sem exigir do outro atitudes que nós mesmo classificaríamos como “corajosas” ou “mínimas” para o anarquista “ideal”.

ANA > Última pergunta para finalizar. Uma vez o presidente Lula disse que o povo brasileiro é doce, pacífico, fácil de se governado. E dias atrás, durante um discurso para funcionários da Volkswagen, em São Bernardo do Campo, falou que o trabalhador brasileiro não precisa mais ficar distribuindo folhetos na porta das fábricas e xingando os patrões... O que você acha dessas declarações? (risos)

Fabrício < Claro, temos a “democracia”, temos a “transparência”, “liberdade de opinião e manifestação” e blábláblá... Mas não vejo uma simples hipocrisia no Lula, apenas uma mudança de posição (de idéias) de quem mudou de posição (político-social). Bakunin bem já avisava...

ANA > Mais alguma coisa?

Fabrício < A memória do terrorismo revolucionário foi por muito tempo sufocada e rejeitada pelos próprios anarquistas, mas isso teve um motivo político plenamente justificável na época (até meados do século XX). O ideal anarquista não conseguiria se fortalecer com uma taxação tão “pesada” como as acusações de “destruidores”, “violentos”; “niilistas”, enfim. Hoje, entretanto, podemos retomar esta memória como fonte de reflexão para nosso presente e tentar compreendê-la melhor, sem repetirmos nós mesmos as acusações feitas pelas elites do passado sobre os companheiros do século XIX.

* Fabrício Monteiro é doutorando em História pela UFU (Universidade Federal de Uberlândia) e professor de História na rede pública municipal de Uberlândia-Minas Gerais.

**Quem quiser adquirir o livro é só entrar em contato com Thiago Lemos Silva atráves do e-mail: thiagobakunin@yahoo.com.br. Ou então atráves do site da editora:www.annablume.com.br. Em ambos os casos, o leitor conseguirá obter o livro por um valor mais em conta que nas livrarias.

***Entrevista concedida a Moésio Rebouças, coordenador da ANA (Agência de Notícias Anarquistas) entre os dias 3 e 5 de junho de 2010.

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